quarta-feira, janeiro 05, 2022

Coisas doutro ano...

O FB trouxe de volta um pequenino post de 5 de janeiro de 2018.

«Hoje, deveria escrever pelo menos a um ou dois amigos, já não escrevo nada a ninguém há algum tempo. Em vez disso, volto-me para o face. :)

Bem, uma das minhas resoluções de Ano Novo foi deixar de falar da minha vidinha de trazer por casa e passar a falar de ideias. Mas, verdade seja dita, sabemos bem que os velhos hábitos demoram a desaparecer. ;)

Assim, querido face, permite-me que te fale do meu primeiro livro de 2018. No segundo dia do ano comecei um tratado das flores, de 1824, que já acabei. Admito que há uma certa estranheza num livro de botânica que não tem uma única imagem. Contudo, tenho de admitir que funciona muito bem como exercício de imaginação. De resto, tanto ou mais do que o que lá estava, apreciei o que se adivinhava: o carinho com que o autor tratava cada uma das flores do seu jardim. Esse carinho resulta da paixão, mas eu sinto que a paixão pelo mundo à nossa volta, ou mesmo pela própria vida, é algo que escasseia nos nossos dias. No mundo que nos rodeia não há um minuto de silêncio, de pausa, de paciência. É um mundo onde tudo tende a ser cada vez mais imediato e superficial. Uma superficialidade global e igual para todos, o que me entristece.

Passemos ao meu segundo livro de 2018: um ensaio de David Lodge, de 2002, A Consciência e o Romance. Prometem-me na capa que, depois de ler este livro, a minha percepção dos romances – e até da própria leitura – nunca mais será a mesma. Sem dúvida um objectivo ambicioso, que possivelmente não será realizado, mas não me posso queixar: «objectivos ambiciosos que simplesmente não se realizam» deveria se o meu nome do meio. :(

Que mais? Cá em casa, já acabamos de ver a nova temporada de Black Mirror, uma das nossas séries favoritas. Fantástica, como sempre. Antes disso, vimos The Handmaid's Tale, também muito boa. 

Hmm, percebe-se agora por que não escrevi aos meus amigos? Escrevo de um modo aborrecido, enquanto penso em torradas de pão de passas, barradas com manteiga e geleia, o que é delicioso, mas excessivo. E café acabadinho de fazer. ;) »

Art by Tanielle Childers.




segunda-feira, dezembro 13, 2021

A sedução fácil de Monet...

Hoje, o facebook trouxe de volta um velho post, onde me indicavam um pintor e eu teria que escrever sobre a sua obra. Bem, só o copiei para aqui, porque estou com saudades do meu amigo Endo e quero dizer isso ao mundo. Acarinho a saudade e sinto que tudo o resto já não importa.

«Calhou-me, então, a sedução fácil de Monet. ;)

Bem, a primeira imagem que me ocorre é a das mulheres com chapéus de sol... não se chamavam sombrinhas? A recorrência desse elemento é um bocadinho irritante, digo eu. Mulheres com longos vestidos brancos, em meticulosos jardins. Jardins de flores predominantemente brancas… Ah! E todas aquelas telas que Monet dedicou às ninféias. É engraçado como eu me lembro disso, várias vezes, ao ver os nenúfares em Tibães. Os nenúfares que aparecem num espaço sempre limitado, mas que Monet nos força a imaginar sem princípio nem fim. Admito que gosto desses quadros dele. :)

Hmm, lembro-me de piqueniques… creio que se chamavam almoços, não? Não importa. Lembro-me de um piquenique num jardim, outro num bosque. Gosto particularmente desse no bosque. Tento lembrar-me das árvores. Tílias talvez. Não sei. Mas sei bem que as mulheres estavam vestidas de branco, ou de cores bem claras, e que a toalha estendida no chão era imaculadamente branca. ;)

Ocorrem-me ainda as paisagens fluviais de Monet, que era apaixonado pelo Sena. Eu identifico-me completamente com essa paixão por um rio. Mutatis mutandis, é como diz a canção: 

I consider myself lucky to have fallen in love 

With a girl, the city, and the river of mud

Sim, bem sei. É melhor parar por aqui, antes que a minha mente me leve para Dalila Pereira da Costa, uma escritora que me deu parte da minha visão do mundo. Mas isso foge completamente ao tema, a não ser por um pequenino pormenor: se eu imaginar uma mulher com um longo vestido branco e um delicado chapéu de sol, essa mulher será sempre a minha querida Dalila. :)

Para terminar, escolho, então, a pintura Amapolas en Argenteuil, óleo sobre tela, Claude Monet, 1873. Pela eterna suavidade da luz, pelo céu, pelas manchas vermelhas dominantes, aquelas belas flores silvestres, papoilas, bem mais ao meu gosto. Ah! E por retratar um passeio de uma mulher com uma criança, que me faz lembrar os meus passeios com o meu filho, sem dúvida, dos melhores momentos da minha vida. :) »



domingo, dezembro 12, 2021

Sem forma, vaga e incerta...

Antes de ir dormir, deixo um velho poema da maravilhosa Sophia de Mello Breyner Andresen.


Às vezes julgo ver nos meus olhos

A promessa de outros seres

Que eu podia ter sido,

Se a vida tivesse sido outra.


Mas dessa fabulosa descoberta

Só me vem o terror e a mágoa

De me sentir sem forma, vaga e incerta

Como a água.


Para mim não vem nem terror nem mágoa, por me sentir sem forma, vaga e incerta como a água. O terror vem quando me construo ou deixo construir, afastando-me de quem eu sou de verdade. E quem eu verdadeiramente sou é algo que tanto encontro agora, como quando tinha cinco anos e ainda estava completamente despida dos papéis que a vida me iria atribuir.

Na minha modesta opinião, este tempo, que precede Yule, é o tempo certo para nos prepararmos, libertando-nos de velhas máscaras e de velhos rótulos, para encararmos o Sol nascente com a nossa face nua.





quarta-feira, dezembro 01, 2021

Como nos livramos da armadura que já não queremos?

Hoje, ao fim da tarde, quando o meu filho preparava a mochila para a escola e colocava lá, como habitualmente, um livro, perguntei-lhe o que é que ele andava a ler. Respondeu-me que era O Cavaleiro da Armadura Enferrujada. Bem, eu adoro esse livro, que foi escrito em 1987, por Robert Fisher. Na verdade, foi um livro muito importante para mim. Mas fiz de conta que não conhecia e perguntei-lhe:

- Então, é sobre o quê?

- É sobre um cavaleiro que precisou de uma armadura, mas depois não a tirou, a armadura enferrujou e ele deixou de ser capaz de a tirar. E, agora, anda à procura de maneiras de se livrar de uma armadura que já não precisa.

- Hmm... e isso é o quê?

Ele sorriu e respondeu:

- Uma metáfora. 

E, sobre isto, eu nada mais tenho a acrescentar. ;)

Hmm, enquanto me deixo ficar aqui, só por um bocadinho, sentindo o peso que eu ainda carrego e que já não preciso de carregar, uma voz doce, como poucas, vai cantando: 

Sunrise, sunrise

Looks like mornin' in your eyes

:)

Boa noite.









quarta-feira, novembro 24, 2021

Swing

Dentro de cada um de nós existe um swing próprio, autêntico. Algo com que nascemos, que é só nosso, que não se pode ensinar ou aprender. Algo que não podemos esquecer. Mas ao longo do tempo, o mundo pode privar-nos desse swing. Fica enterrado dentro de nós, sob o peso das desculpas que arranjamos para o que devíamos ter feito. Algumas pessoas até se esquecem de como era o seu swing...»

Somos condicionados, desde crianças, a pensar que há um caminho para a felicidade, de tal modo que nos habituamos a ver a felicidade como algo que irá acontecer no futuro, quando várias premissas se concretizarem. 

Na verdade, não há nenhum caminho que nos conduza à felicidade, porque a felicidade é que é o caminho.

Contudo, para entrar nesse caminho, precisamos do nosso swing... e, por mais que eu esteja a ser repetitiva, irei continuar a dizer isto. Faço-o, em parte, para me ensinar a mim própria. Também eu preciso de reencontrar o meu swing e dançar nas clareiras ao luar.

:)

Termino com esta pintura mágica: Le villi, 1906, de Bartolomeo Giuliano.



quinta-feira, novembro 18, 2021

Coisas que não há que há

Hoje, no dia do aniversário do saudoso Manuel António Pina, deixo aqui um poema do qual eu gosto muito: Coisas que não há que há.


Uma coisa que me põe triste

é que não exista o que não existe.

(Se é que não existe, e isto é que existe!)

Há tantas coisas bonitas que não há:

coisas que não há, gente que não há.

bichos que já houve e já não há,

livros por ler, coisas por ver,

feitos desfeitos, outros feitos por fazer,

pessoas tão boas ainda por nascer

e outras que morreram há tanto tempo!

Tantas lembranças de que não me lembro,

sítios que não sei, invenções que não invento,

gente de vidro e de vento, países por achar,

paisagens, plantas, jardins de ar,

tudo o que eu nem posso imaginar

porque se o imaginasse já existia

embora num lugar onde só eu ia…


Pintura de Amadeo de Souza Cardoso, 1917.

sexta-feira, setembro 25, 2020

Uma rapariga à janela

Não basta abrir a janela 

Para ver os campos e o rio. 

Não é bastante não ser cego 

Para ver as árvores e as flores. 

É preciso também não ter filosofia nenhuma. 

Com filosofia não há árvores: há ideias apenas. 

Há só cada um de nós, como uma cave. 

Há só uma janela fechada, e todo o mundo lá fora; 

E um sonho do que se poderia ver se a janela se abrisse, 

Que nunca é o que se vê quando se abre a janela.


Alberto Caeiro


Hoje, o facebook de uma amiga trouxe este velho poema. Bem, na minha vivência da espiritualidade, este poema de Pessoa reflecte uma das minhas ideias principais: a noção de que o sujeito que vê e o acto de ver não são a mesma coisa. Esta noção leva-me à procura de uma representação do mundo, onde eu não detenho o foco central, mas sim o mundo em si mesmo. Contudo, a nossa visão do mundo e sua consequente representação, com o foco no sujeito, em quem vê, mesmo sendo um conceito moderno, está demasiado entranhada e não é nada fácil libertarmo-nos dela. 

Bem, para terminar, deixo uma janela para um mundo antigo, através da fantástica banda Sangre Cavallum e deste maravilhoso álbum Veleno de Teixo. E ainda uma rapariga à janela, de Salvador Dalí.



quinta-feira, setembro 24, 2020

Manhã de chuva

Post que coloquei no facebook:

Acordei triste esta manhã, mas hoje está um belo dia de chuva, não é um dia para se estar triste. :) A chuva, como tudo na vida, é mais bela quando é sentida. Como disse Bob Dylan, uns sentem a chuva, outros apenas se molham. Eu não quero ser dos que apenas se molham... :)

Termino este pequenino post com uma alegre pintura de Pete Rumney e com um segredo... :) O segredo vi-o ontem no facebook de uma amiga e dizia que o adulto acredita no que existe, mas a criança só existe no que acredita. Já não sei de quem é a frase, mas sei que me fez sorrir quando a li. Eu tenho gostos simples, gosto de coisas que me fazem sorrir. :)

Bom dia. :)











Depois, em resposta a alguns comentários, deixei dois pensamentos que transcrevo, talvez para voltar a eles mais tarde... 

«Para mim, tal como para Pessoa, tudo é símbolo e analogia. Também eu falo da beleza de andar à chuva, quando chove, ou ao sol, quando está sol. Sei bem que um dia de chuva ou um dia de sol deviam ter encanto em si mesmos, mas temo que tudo se misture e que sejam as memórias que atam e desatam o sentimento. É a demanda pela eternidade, não é? Hmm, gostas de Dalila Pereira da Costa? "Ah, mas sinto que nada mais hoje devia ter feito, dito, do que pensar, fundo, reviver, reaver, essa vida num dia."» 

«Se calhar, digo eu e eu engano-me muitas vezes, o dia que amanhece com chuva deprime-te porque sentes que não há ali nada teu, naquele amanhecer. Mas já houve e pode haver de novo… "Ah, a frescura das manhãs em que se chega…" como dizia Pessoa. Bem, eu creio que mais importante do que chegar a algum lado, talvez seja chegarmos nós à manhã que começa. Não sentes que nos deixamos repartir por muitos lugares e por muitas preocupações? Ultimamente, eu sinto profundamente a necessidade de aprender a reagrupar o meu eu e simplesmente chegar… chegar à frescura das manhãs, quer sejam de sol ou de chuva.»



sábado, julho 04, 2020

Filmes em família.

Esta noite foi uma noite como muitas outras, durante o verão. Vimos dois filmes em família. Sim, dois. Naturalmente, por duas simples razões: somos excessivos e um filme acaba muito antes do sono chegar. Começamos com uma comédia de 2014: Alexander and the Terrible, Horrible, No Good, Very Bad Day. Não posso dizer se é ou não uma boa adaptação do livro de Judith Viorst, uma vez que nunca o li. Mas posso dizer que gostei do filme e que me ri bastante.

O segundo filme foi outra adaptação de outro livro famoso, este muito mais conhecido por cá: O Jardim Secreto, de Frances Hodgson Burnett. Tratou-se do filme de 1993, de Agnieszka Holland, que é lindíssimo. Eu também gostei muito do filme dela de 2017, Pokot. Mas esse não é nada adequado para ver com uma criança de 11 anos. Pelo contrário, Jardim Secreto é perfeito para terminar uma noite de cinema em casa e em família, que se quer bela e mágica. :)


quinta-feira, julho 02, 2020

Um sonho só acaba, para dar início a outro...

O que é bonito neste mundo, e anima,
É ver que na vindima
De cada sonho
Fica a cepa a sonhar outra aventura...
E que a doçura
Que se não prova
Se transfigura
Numa doçura
Muito mais pura
E muito mais nova...

Miguel Torga

É bem possível que um sonho só acabe, para dar início a outro. ;)

Pintura: Fairy Dance, de Hans Zatzka (1859-1945).


Passamos pelas coisas sem as ver

Passamos pelas coisas sem as ver,
gastos, como animais envelhecidos:
se alguém chama por nós não respondemos,
se alguém nos pede amor não estremecemos,
como frutos de sombra sem sabor,
vamos caindo ao chão, apodrecidos.

O poema é de Eugénio de Andrade, um poeta que eu muito aprecio. Ele tem razão, o mundo deixa-nos assim, se permitirmos. É tão fácil ficarmos meras sombras de quem fomos e de quem queríamos ter sido... Como se luta contra isto? Bem, eu só conheço uma maneira: sendo feliz. A felicidade devolve-nos a nós próprios, deixa-nos inteiros. Se não muda o mundo à nossa volta, muda certamente a nossa maneira de ver esse velho mundo, que amanhece sempre novo, em cada dia. :)


quarta-feira, junho 24, 2020

Cariatide tombee portant sa pierre, de Rodin.

Um post do face, de rochas numa praia em África, levou-me a pensar numa conhecida escultura: Cariatide tombee portant sa pierre, de Rodin.

Rodin fez mais do que uma Cariátide caída...  Para quem não se lembra, Cariátide é o nome dado à figura de uma mulher, tipo coluna, que era usada como poste de sustentação da parte de cima de um edifício, na Grécia antiga.

O nome vêm de outras Cariátides, raparigas que dançavam para a deusa Artemis e que, nas suas danças circulares, carregavam na cabeça cestos com juncos.

Admito que tudo isto me agrada. Gosto da sonoridade da própria palavra, gosto da ideia da dança em círculos, com plantas a sair das  cabeças das jovens, e gosto da arquitectura grega. Naturalmente, também gosto da escultura de Rodin, com a bela Cariátide abraçando-se a si própria, ao mesmo tempo que o peso da pedra que carrega a derruba e a destrói. Há imensa beleza e compaixão, que me emociona. :)

Braga, 22 de junho de 2020.

sexta-feira, abril 17, 2020

Um melro ao crepúsculo...

Dantes era azul
a cor dos sonhos
e a imensidão do mar
por navegar.
(…)

Começa assim um poema de Maria Alberta Menéres. Nem sei por que razão isso me ocorreu, neste instante, enquanto olho lá para fora e vejo as tílias, viçosas e luxuriosamente verdes, a dançar com o vento.

Ontem, igualmente ao fim da tarde, quando o sol já desaparecia a oeste, eu também estava aqui, no mesmo sítio, sentindo que precisava de um sinal, um sinal qualquer, só porque sim. Nesse instante, um melro pousou na grade junto à pequenina e intensamente florida macieira, que cresce num vaso na minha varanda. E o melro deixou-se ficar quieto, simplesmente a olhar para mim, ou para o meu mundo, ou para outra coisa qualquer. Um melro ao crepúsculo é, sem dúvida, um sinal. Ainda assim, eu hoje continuo aqui, no mesmo lugar, quase igualmente desorientada e distraída.

Não o fotografei, quando me levantei para ir buscar o telemóvel, o melro voou para longe. Contei ao meu filho, que se riu e me disse: «se não o fotografaste, não conta!». Isso fez-me sorrir. Mas, agora, começo a questionar-me se ele não estaria certo…

Neste instante, noutro lugar, alguém acabou de fotografar um melro, ao crepúsculo. E sentiu a força desse sinal. Hmm, como é que eu posso ter tanta certeza? Na verdade, não é uma questão de fé. Acabei de receber um email, não com uma fotografia, mas com um vídeo de um belo pássaro negro... ;)

Azul. Azul é a minha cor favorita, por muitas razões. Também porque dantes era azul a cor dos sonhos e a imensidão do mar por navegar.

Maria Alberta Menéres morreu esta semana. Ontem, também morreu Luis Sepúlveda, outro escritor que eu muito aprecio. É triste. É a vida, que começa para uns e acaba para outros.

Termino com uma ilustração de Jeanne Waltz.

Boa noite.


terça-feira, janeiro 07, 2020

Novo ano, novas ideias.

Hoje, o face mostrou-me uma memória de 2018, onde afirmo que uma das minhas resoluções de Ano Novo foi deixar de falar da minha vida insignificante e passar a falar de ideias. Hahahaha…

Ainda no mesmo post, com a desculpa de que os velhos hábitos demoram a desaparecer, falei do meu primeiro livro de 2018: um tratado das flores, de 1824, do qual já só tenho uma ideia muito vaga. Lembro-me sobretudo da estranheza de um livro de botânica que não tinha uma única imagem. A memória é uma coisa interessante, mas também estranha.

Em 2020, já que eu não consigo libertar-me do vício de olhar para o meu passado, quero ver apenas experiências, umas com melhores resultados do que outras, algumas com elevado nível de sofrimento, mas, ainda assim, apenas experiências, sem os rótulos certo ou errado.

Hmm, eu estou a envelhecer. Envelhecer é uma coisa boa, creio que ansiei por isso toda a minha vida. Não pelas rugas nem pelos cabelos brancos, naturalmente. Mas por aquela sabedoria, ainda que pouca, que só vem com a idade. Só a idade nos faz olhar o tempo de outra maneira, valorizando-o como aquilo que realmente é: insubstituível. Só a idade nos traz o prazer crescente das coisas simples.

Ao mesmo tempo, precisamente por ter consciência de que estou a envelhecer, anseio por coisas novas. Desvio-me do percurso habitual e caminho por outras ruas. Experimento novos sabores, novos lugares. Ouço novas músicas. Contudo, nos filmes e nos livros noto que tendo a regressar aos velhos amores. O que, naturalmente, também não é proibido. ;)

Por falar em filmes, num filme sul-coreano que eu vi no ano passado, do qual não recordo o nome, uma personagem estava a fazer um curso de poesia. Bem, esse não é o enredo principal da história, ainda que pudesse ser. É só uma linha secundária do argumento, que me cativou. Então, foi ensinado à personagem que o primeiro passo para trazer a poesia para a sua vida era, precisamente, reparar nas pequenas coisas, que facilmente passavam despercebidas, na azáfama dos dias. Admito que gosto disso. Há dias em que reparo em coisas nas quais nunca tinha reparado antes e isso é muito gratificante. Também é interessante manter a minha mente focada, orientada para singularidades.

Hmm, não sei bem por que razão, os meus pensamentos levaram-me para Ayn Rand e o egoísmo como virtude. Mas isso não é o que eu professo, de todo. Contudo, sinto que tem que haver um equilíbrio. Certamente, não quero viver totalmente em função de mim própria, mas também não quero viver totalmente em função dos outros, mesmo que os outros sejam aqueles que eu amo.

Termino, então, este primeiro post mais pessoal, de 2020, com uma frase do Dalai Lama: «Sê sabiamente egoísta.» ;)


sábado, novembro 23, 2019

Vitória da Samotrácia

Eu adoro esta estátua. A maravilhosa e alada Vitória da Samotrácia faz parte de mim, há muito tempo. Já fazia parte de mim quando adolescente vi, pela primeira vez, o pôr do sol sobre o mar. Talvez pela forma de proa de embarcação da sua base, ligada às suas magníficas asas, talvez por outras razões que não identifico, a verdade é que facilmente a imaginei lá, nesse momento em que o céu se liga ao mar. Depois, bem, depois imaginá-la lá nesse instante e nesse lugar onde o sol desaparece no horizonte do mar, tornou-se quase tradição, para a minha mente estranha e absurda. :)

Hmm, eu sei bem que aquilo que amamos, amamos a sós... e daí? ;)


quarta-feira, novembro 20, 2019

Umbilicus rupestris

Estou a saborear um novo chá, que é delicioso. E a música de Eivor ecoa nas minhas células, enquanto penso no umbigo de vénus. Na verdade, nunca entendi por que razão se pode dizer verde alface e não verde umbigo-de-vénus. Eu adoro esta plantinha, que é um umbigo lindo, lindo. :)

Todos os dias, durante a semana, passo junto a um longo muro, onde os umbigos se multiplicam, levando-me a imaginar aquelas pequeninas e sexys vénus verdes, pelo muro fora. Ao mesmo tempo que a música invade a minha mente. Som e visão, as duas formas perceptivas que os gregos mais valorizavam, mas não as minhas prediletas.  

Bem, os gregos, mestres da beleza, pintaram os cabelos de Afrodite de azul. Eu, pela minha parte, gosto de imaginar aquelas pequeninas vénus verdes, que no suave toque reintroduzem em mim a energia da vegetação. Assim, aquele muro transforma-se, modificado pelas relações que eu estabeleço e que fazem dele uma espécie de berço ctónico, telúrico e primitivo, ligado à pátria granítica. 

O valor sagrado que as sociedades primitivas atribuíam, por exemplo, a certas rochas, não residia nas rochas em si mesmas, mas naquilo que representavam, porque imitavam alguma coisa, porque vinham de algum lado especial, em suma, porque tinham em si algo diferente delas mesmas. O mesmo se passa com o meu berço ctónico.

Se a consagração, a sacralização se fazia pela via da imaginação, já a verdadeira participação naquele poder mágico/sagrado fazia-se sobretudo pelo toque, bem mais do que pela litania ou pela invocação.

Pronto, fico por aqui. Até porque o chá já acabou e, agora, os meus pensamentos são outros.



quinta-feira, novembro 07, 2019

Viagem de comboio na Linha do Tua


Já passa muito da meia-noite, é outro dia. Mas, para mim, ainda não é. Ah!, que sugestão maravilhosa! Bem, hoje foi um bom dia, mas este final transforma-o, torna-o memorável. Muito obrigada! :)

Durante cerca de meia hora, fui novamente a miúda que adorava esta viagem e que raramente parava de olhar o rio Tua, em baixo, ora quase ao nível da linha, calmo e pacífico, ora longínquo, no vale profundo, correndo selvagem pelo meio das pedras. Neste vídeo o rio mal se vê e isso levou-me a pensar que talvez, na minha própria peregrinação, o elemento fundamental, que define tudo o resto, também seja apenas intuído.

Bem, em tempos, escrevi aqui, na minha clareirazinha, o seguinte: «Eram 6 horas da manhã e eu estava com a minha família, na estação dos caminhos de ferro, à espera de comboio. Pouco antes de chegar o comboio, veio a correr um miúdo pouco mais velho do que eu, com quem eu tinha brincado as férias todas. Aproximou-se e deu-me dois beijos, despediu-se de mim. E quase de imediato, entrei no comboio. Percorri a linha da Tua, até Mirandela, num estranho estado de desligamento... Não sei se estava ou não apaixonada. E esses termos ainda não existiam para mim, na altura. Mas, para sempre, dentro de mim, as estações de comboios e, em especial, a linha do Tua, ficaram associadas a algo que nos transporta para fora de nós próprios, a uma estranha sensação de agigantamento.»

Tinha 12 anos e essa não foi a primeira viagem que eu fiz na linha do Tua, mas foi a primeira vez que a paisagem me disse claramente quem eu era. Foi a primeira vez que eu senti, de verdade, a canção da saudade, a subir da terra ao céu. Bem, quando penso nisso, sou levada a crer que a primeira vez que a saudade se manifestou - a saudade galaico-portuguesa, que não é uma palavra, mas sim um método de ascensão, de transfiguração – foi muito mais tarde, mas não é verdade, foi aqui, através da paisagem.

Esta viagem já não se pode fazer, a não ser virtualmente ou por via da memória. Mas, esta noite, que bom que foi fazê-la de novo, tão inesperadamente, como um presente perfeito.

Era uma viagem que durava duas ou três horas, o vídeo está acelerado, mas isso não importa. Foi maravilhoso fazer novamente esta viagem e levar comigo as pessoas que eu amo, recriando completamente aquele momento do meu passado. Obrigada!


Viagem de comboio na Linha do Tua.

quinta-feira, outubro 24, 2019

Batata coração.

Hoje, ao descascar as batatas para o jantar, encontrei esta belezinha pequenina, a lembrar Agnès Varda e o seu filme Les glaneurs et la glaneuse, E, mais do que isso, a recordar-me o amor imenso que colocamos nas pequenas coisas. Trouxe-me também à memória um episódio com o meu filho, ainda muito pequenino, a acusar a avó de que ela não cozinhava com amor. E quando ela quis saber por que razão ele dizia tal coisa, ele limitou-se a acrescentar: «porque a tua comida não sabe bem!».

Assim, entre outras coisas, fiz um bolo de chocolate com muito, mesmo muito amor. Hmm, está uma delícia! ;)


Voar...

Sim, bem sei, só os pássaros com a mesma plumagem voam juntos, mas isso não quer dizer que tu voas sozinho. Na verdade, tu nunca estás sozinho, pois aqueles que amaste ou que amas estão sempre, sempre contigo.

Por favor, não te esqueças, mesmo se uma das coisas que te põe triste é que não exista o que não existe, como dizia o poeta… mesmo nesses momentos, não te esqueças que quem não ri e não voa contigo, não é teu amigo!

Metal Migration, by Michelle McKinney.


Mais pensamentos soltos...

Bom dia. :)

Hmm, por onde começo? Bem, o músculo da minha perna ainda não está bom. E, vê só, agora só consigo andar de saltos bem altos. Hmm, qual era a mensagem do universo, afinal?... ;)

Na verdade, não quero saber das mensagens do universo, importa-me o que eu quero!...

Ontem à noite, uma amiga desejou que os meus dias fossem leves. Respondi-lhe o seguinte:

«Minha querida, agora que penso um pouco mais nisso, bem, não estou muito certa de querer que os meus dias sejam leves… ;) Que posso eu dizer? Mais do que portuguesa, eu sou uma mulher do norte. Tenho a saudade na alma. Eu quero que os meus dias sejam intensos, duma felicidade transbordante, mesmo que também sejam, como na canção, um abismo antigo onde voar é abrir as asas e sangrar. :) Não te assustes, por favor, isto sou só eu a ser eu própria. ;) E, no fundo, entendo bem a beleza e a alegria desse teu dia leve… leve e puro, como diria a minha adorada Sophia, e livre como o vento… como o florir das ondas ordenadas. :) Não a lês, pois não? Sophia de Mello Breyner Andresen. Tão, tão maravilhosa! :) Hmm, o meu amado Fernando Pessoa também gostava do vento, dizia que às vezes ouvia passar o vento… e só de ouvir o vento passar, valia a pena ter nascido. :) Boa noite, minha querida, que os teus dias sejam felizes! :) »

Transcrevi este comentário, só para te dizer que é realmente isso que eu quero: que os meus dias sejam felizes!

Se queres mesmo viver, então deixa que invadam os teus sentidos como um sonho e que corram nos teus sonhos como uma sombra... sim, bem sei, são novamente palavras do Pessoa. Mas há tantas, tantas palavras dele na minha mente... Tanto de mim, que é dele. 

Que mais? Esta manhã, li uma carta que alguém me escreveu, a propósito do meu blog peregrinar. Como a carta estava em castelhano, não percebi tudo, mas sei bem que me insultou-me q.b. Ainda assim, fiquei deliciada. Disse-me que eu tinha ideias interessantes, mas que não as desenvolvia, que eu escrevia muito pouco, que não tinha nenhuma consideração pelos meus leitores. Foi isso, eu não sabia que tinha leitores e isso, por si só, fez deu ao café um gostinho diferente. ;)

Depois, não sei de todo porquê, deu-me para ouvir Wham!... Wake me up... 😲

Que queres que te diga? Eu também estou confusa. A minha mente está a reagir a isto de eu, agora, andar sempre de saltos altos, de um modo muito peculiar. O que quer dizer que possivelmente está tudo bem, uma vez que a minha mente reage de um modo muito peculiar praticamente a tudo. :P

Hmm, dançamos?... :)

Ok. Então, vou voar!... :P


terça-feira, outubro 22, 2019

Pensamentos soltos...

(A propósito de uma memória no face, que me mostrou um folar feito em 2017, no dia 22 de Outubro.)

Hmm... se eu fizer hoje um folar e fizer de conta que no ano passado, neste dia, também fiz um... bem, começo uma espécie de tradição, não? :P

Pois, até parece que eu não gosto de tradições, não? Ora, eu adoro velhas tradições, mesmo as que começaram de um modo tão absurdo, como a que acabei de referir.  ;)

Outono de 2017? Se bem me lembro, e eu lembro-me de tudo, nesse mês de outubro, eu queria, porque queria, que um amigo acabado de conhecer, cujo pai tinha nascido numa aldeia a escassos 3 km da minha, me permitisse mostrar-lhe a ele e à família aquele mundo. Um mundo onde as velhas tradições ainda são o que sempre foram. Um mundo misterioso e mágico, como dificilmente se encontram, muito dificilmente. 

Hmm, isto está a ficar um bocadinho aborrecido, até por se estar mesmo a ver que ninguém quer saber das minhas rotas de peregrinação pela paisagem, pelo corpo da minha tribo. E isso aborrece-me. Assim, acho que vou deixar o meu alter ego escrever por mim… :P

Pensas que o meu alter ego é uma miúda de 17 anos, que gosta de viajar pelas estrelas, certo? Achas? Não, na verdade é um gajo todo musculado, muito alto e loiro. Chama-se Fafhrd, não é nenhuma doçura, mas é um exímio e violento espadachim. :) Agora, por favor, não me digas que nunca leste Fritz Leiber, porque eu não quero saber nada de nada do que não leste.

:D

Música?... Na verdade, estou a ouvir a Quinta Sinfonia, de Beethoven. Hmm, o meu filho, quando era bem mais pequeno, uma vez disse-me: «põe aquela música assustadora!», para ouvir isto. Bem, como eu adoro esta música, que já não ouvia há imenso tempo. :)

Boa tarde. :)


segunda-feira, outubro 21, 2019

Quando o universo nos responde...

Esta manhã, deixei o meu filho na escola um pouco depois da hora, talvez para me esquivar a encontrar muitas das outras mães que se recusam a responder quando eu digo bom dia. Porque eu tenho lepra, naturalmente.

Hmm, que te posso eu dizer? Eu continuo a acreditar que quando olhamos directamente para o coração humano, o caminho abre-se à nossa frente e, de imediato, somos pessoas melhores. :)

Claro que posso sempre dizer que aquelas pessoas não me cumprimentam, porque não me conhecem. Mas, se quiser ser honesta, tenho que admitir que mesmo alguns daqueles que estão no meu coração, ficam por vezes irritados com a minha visão do mundo, com a minha honestidade, com o meu paganismo... e atiram-me com a inquisição espanhola. And nobody expects the spanish inquisition. Pois, mesmo quando está sempre a aparecer.

And shout out loud
I don't mind, I don't mind

Kongos, mais uma vez. Hmm, importar-me até que me importo, mas nem por isso deixo de ser quem sou. Bem, depois de deixar o meu filho na escola, não vinha a ouvir Kongos, era outra banda qualquer, uma música alegre e jovial. E, sem mais, sabe-se lá porquê, decidi questionar o universo. Queria saber se eu iria continuar a ser invisível para sempre. Queria saber o que eu poderia esperar dos outros.

Mal tinha acabado de formular a minha pergunta, quando o universo me respondeu.

Estava a atravessar uma passadeira, quando um carro que estava parado, para deixar passar outras pessoas, arrancou e me atingiu. O carro parou de imediato, um homem saiu e disse que não me tinha visto. Entretanto, apareceu outro homem que insistiu que a culpa era minha, que eu não podia andar na rua de headphones. Berrei incoerente, com eles, comigo própria, com o universo, desesperei, depois parei e fui embora a arrastar uma perna, literalmente.

And I know what I know
But I don't know what I know when I know it
And I hear what I hear
But I don’t know what I hear when I hear it
And I see what I see
But I don't know what I see when I see it

Não gostei da resposta. Lamento ter feito a pergunta, até porque eu sabia muito bem qual era resposta. Mesmo assim, estou chateada com o universo. Não sei o que esperava, mas certamente não era aquilo.

Hmm… numa manhã de Abril, em 2005, um carro também me atropelou numa passadeira, mas dessa vez foi muito pior. O carro atirou-me uns quantos metros pelo ar e eu aterrei de costas no asfalto. Mas não me lembro da queda, só me lembro do choque com o carro, do voo e, de repente, estar noutro lado. Tinha novamente 17 anos, estava deitada de costas na terra quente numa deliciosa noite de verão, olhava as estrelas. Mas aquele não era o mundo que eu conheci. Era um lugar absolutamente maravilhoso. Mágico. Ele estava deitado na terra quente ao meu lado, também olhava as estrelas. Ele não era o homem por quem eu estava apaixonada quando tinha 17 anos, mas eu sabia bem quem ele era, uma vez que ele frequentava os meus sonhos desde sempre. Mas tudo aquilo me pareceu demasiado real para ser um sonho e eu perguntei-lhe se estava morta. Ele disse-me que ainda não, mas que eu estava a morrer. De repente, a vontade absurda de não morrer tirou-me daquele mundo maravilhoso e eu vi-me a mim própria no meio da estrada. Havia várias pessoas à minha volta. E eu percebi que ninguém tinha chamado uma ambulância. Terá sido o horror desse pensamento que não me deixou continuar? Possivelmente. Havia uma pessoa que me custava mesmo muito deixar, mas aquilo era diferente: cada átomo do meu ser rejeitava veemente aquela indiferença. Eu não queria morrer assim, sem que tivessem qualquer compaixão por mim, sem a mais pequena assistência pelos seres humanos que me rodeavam. Ele continuava ao meu lado e perguntou-me se eu tinha a certeza de que queria voltar. Eu disse que sim. De repente, um pensamento igualmente assustador varreu a minha mente e eu perguntei-lhe o que me ia acontecer. Ele respondeu com outra pergunta, questionando o que eu queria que acontecesse. Nada, foi o que eu disse. De imediato, vi-me a olhar para cima e ele estava ali, à frente das outras pessoas. Ele olhou-me com ar divertido e disse-me: «tu nunca me agradeces, miúda». Sorriu e desapareceu. E eu senti uma tristeza como nunca tinha sentido, já não queria estar ali no meio do chão, sem sentir o meu corpo e com as pessoas, que me rodeavam, a falarem como se eu estivesse morta. Mas não estava morta e, algum tempo depois, pude mexer os braços, consegui falar e pedi um telefone. Chamei uma ambulância. Mais tarde, no hospital, quando me passou aquele torpor todo, constatou-se que eu tinha saído praticamente ilesa do acidente.

Hmm… eu sei disso, isto vai ser uma festa para inquisição espanhola. E daí?... ;)

Hmm... espero que a minha perna cure, em breve. É outono e eu quero dançar. :)



sábado, outubro 19, 2019

Rindo de mim própria.

Hmm, a ideia era escrever qualquer coisinha suave e alegre, só para manter o meu perfil calibrado. Mas, sem qualquer razão aparente, a minha mente trouxe-me Rabelais e eu fui à procura da lista de serpentes, em Gargântua e Pantagruel. E, agora, voltei. Aqui estou eu, ainda com muitos dos nomes, daquela estranhíssma lista, a aparecerem como pensamentos relâmpago na minha mente, enquanto penso naquilo que te vou dizer.

- Bom dia!

Não consigo deixar de me rir. De mim própria. Piedosamente. Copiosamente. Ruidosamente.

Nem o balsamozinho de ser sexta-feira parece socorrer-me. Preciso daqueles amigos que crêem. Ou daqueles que crêem crer. Ou mesmo daqueles que só parecem crer.

Caos. Eu sei. Mas é tudo relativo, depende da perspectiva. O caos para a mosca, é a ordem para a aranha.

alguém me disse isso ontem. Depois, bem, o meu dia piorou consideravelmente e a noite foi trágica. Voltaram os meus velhos pesadelos. E, esta manhã, acordei triste. Mas cada dia é, em si mesmo, único e irrepetível. E eu não quero que as minhas mágoas me impeçam de o viver. 

Sunrise, sunrise
Looks like mornin' in your eyes

A manhã já acabou, mas a voz de Norah Jones continua a ouvir-se, clareando o espaço dentro de mim. Hmm, quem seria eu, sem música?

Lembras-te de Parsifal e da pergunta que ele não conseguiu fazer? Que posso fazer por ti? É também essa a pergunta que, muitas vezes, nos esquecemos de fazer… hmm, eu não me quero esquecer. Nem quero ser outra. Quero continuar a ser eu própria, por mais mal-entendida que possa ser.

Bem, agora vou voltar ao meu bosque dos poetas, que possivelmente nunca concretizarei, mas que me deixa feliz, quando o imagino. Um negrilho para Miguel Torga, madressilvas para Eugénio de Andrade, um cedro para Khalil Gibran, um ginko para Goethe, um castanheiro para Yeats, uma romãzeira para Rumi… e muitas outras árvores para outros tantos poetas, uma floresta inteira para Fernando Pessoa.

Há um murmúrio na floresta,
Há uma nuvem e não já.
Há uma nuvem e nada resta
Do murmúrio que ainda está
No ar a parecer que há.

É que a saudade faz viver,
E faz ouvir, e ainda ver,
Tudo o que foi e acabará
Antes que tenha o que esquecer
Como a floresta esquece já.

Termino, assim, com um poema de Pessoa, com a voz de Nina Simone, em Feeling Good, com uma fotografia de um lugar que eu amo, com o desejo de que tenhas um bom dia e com um sorriso. :)






quarta-feira, outubro 16, 2019

Anedota com moralidade...

Uma noite, ela entrou num bar, no topo de um edifício e foi imediatamente abordada por um desconhecido bêbado, com um copo na mão, que lhe disse:
- Tens que provar esta bebida azul. É mesmo incrível. Faz-te voar!
- Fantástico - disse ela condescendente, enquanto tentava afastar-se dele.
- A sério! - respondeu ele e, com um sorriso enorme, acrescentou - deixa-me provar que é verdade!
De imediato, o desconhecido correu e atirou-se do edifício, reaparecendo pouco depois, a voar.
Convencida, ela dirigiu-se ao barman e pediu aquela extraordinária bebida azul. Esvaziou o copo de um trago e aproximou-se da beira do terraço. Parou, hesitou por uns segundos, riu, tirou a roupa e, sem mais contemplações, atirou-se do topo do prédio, nua e em direção ao vazio. Nesse instante, ouviu a voz do barman a repreender o desconhecido:
- Super-homem, tu quando estás bêbado és incorrigível!...
Já em queda livre, ela sorriu e disse para a escuridão à sua volta:
- Que importa? Até chegar ao chão é só rock' n' roll.

Hmm, passemos, então, à moralidade: a vida é uma anedota, há sempre alguém capaz de nos levar ao abismo, e nem precisa de razões, pode muito bem ser só pelo gozo, mas nós podemos sempre apreciar a experiência de estar vivo.
Apreciar cada minuto é tudo o que importa, quer haja ou não outro sentido.

La Nuit by Auguste Raynaud (1845 – 1937).


terça-feira, outubro 08, 2019

Under the milky way tonight…

Comecei por responder a uma grande amiga, que deixou esta música num comentário. Mas, de alguma forma, a pequena resposta transformou-se num post, possivelmente por razões misteriosas. Ou não. ;)

Esta música faz-me lembrar as noites quentes de verão, quando eu ficava longas horas deitada de costas no chão, a vaguear pelas estrelas. Tinha dezassete anos e estava apaixonada. Vivia um amor rebelde, intenso, absurdo. Não era um amor correspondido, mas como o encontrei num livro e, na verdade, ele tinha morrido muito antes de eu nascer, não me sentia propriamente rejeitada. Era algo para outra vida… ;)

Ele não trazia cor ao meu dia, mas dava profundidade à escuridão da noite, tornando a mais banal das noites em noite noitíssima, em que a profusão e a intensidade das estrelas nos impelem à viagem. Inicialmente, numa viagem em direção àqueles pontos luminosos que, quando nos deixamos realmente ir, rapidamente se torna uma viagem pela escuridão, pela vastíssima escuridão que é o verdadeiro corpo do universo. Uma escuridão livre, isenta da moralidade que os humanos insistem em lhe atribuir. Um aspecto do universo que é negro e fecundo como a própria Terra, onde podemos deixar germinar a semente que existe em nós. A escuridão que é o lugar de todos os sonhos.

Under the milky way tonight…

(Foto retirada do site Wonderful Places In The World, desconheço o seu autor.)


sábado, agosto 31, 2019

Seis coisas impossíveis antes do pequeno-almoço.



Ontem escrevi que, durante esta semana, todos os dias tenho feito um esforço para pensar em seis coisas impossíveis, antes do pequeno-almoço. E, garantidamente, esforço-me por acreditar nas minhas coisas impossíveis. ;)

Encaro-o como um exercício consciente de revolta. ;)

Bem, esta manhã, pouco depois de acordar, deparei com uma gaivota na minha varanda. Tive pena dela, porque estava perdida, longe de casa. Mas, ao mesmo tempo, não consegui deixar de pensar que a gaivota sabia que estava longe de casa, que se tinha perdido no seu voo. Certamente, fará tudo o que estiver ao seu alcance para regressar ao seu verdadeiro lugar.

Eu, por outro lado, quando me perco, levo uma eternidade para descobrir que estou perdida. E, o que ainda é pior, é cada vez mais difícil ter certezas em relação ao meu verdadeiro lugar.

Há muitos momentos em que tenho dificuldade em acreditar que ainda me chamo Maria e não Gregor Samsa. É com um estranho divertimento que penso que, um destes dias, ainda acordo transformada num inseto e, nem assim, deixarei de lado as preocupações em relação ao emprego, ao dinheiro e às necessidades da família.

Noto, também, que ultimamente regresso muitas vezes ao livro infantil de Margaret Wise Brown, The Important Book, publicado em 1949. À medida que percorro as ruas, apressada, interrogo-me acerca do que é importante para mim: nas casas, nas árvores, na paisagem, no vento, nas nuvens… Adoro esses instantes em que as minhas próprias respostas me surpreendem. ;)

Contudo, no livro de Brown, tudo nos conduz a duas questões finais:

- O que é que poderias mudar em ti e ainda continuares a ser tu próprio?

- O que é que não poderias mudar em ti, para continuares a ser tu próprio?

Bem, eu acredito que é importante fazer estas perguntas a mim própria, de vez em quando, quanto mais não seja, para não me esquecer completamente de quem eu sou. ;)

Hmm, escrevi muito, não foi? Termino, então, com uma imagem e Yuumei Art. :)



terça-feira, julho 02, 2019

Pegadas no meu mundo...

Hmm… quase parece a paisagem dos nossos sonhos, caso a sonhássemos, não? :) Bem, eu sonho e o meu mundo é praticamente este, só não há casas, nem cercas, nem portões. E as árvores são muito mais antigas, altas e majestosas. Também não há flores em canteiros, as flores aparecem por todo o lado, sem qualquer tipo de restrição. ;)

Ocorreu-me um pensamento inesperado: haverá pegadas? :)

Hoje acordei com uma frase do Ray Bradbury a pairar na minha mente. Deixa cá ver se ainda me lembro, sim, porque eu não acordei agora, acordei há muito tempo. :P

Era algo relacionado com as pegadas que deixaram aqueles que caminharam no nosso coração. Hmm, qualquer coisa como isso, mas mais concreto. Bem, não sei bem por que razão, houve várias pessoas que saíram da minha vida, ao longo do tempo. Estranhamente, não é um pensamento deprimente. E, se querem mesmo saber, cada vez aceito isso mais facilmente, ao mesmo tempo que continuo a sentir-me feliz com as pegadas que outros deixaram no meu mundo. :)

Voltando aos sonhos. por maior que seja a beleza dos lugares com que sonhamos, na minha modesta opinião, o mais importante é não esquecer que, ainda assim, continuamos a ser o que sempre fomos: um universo inteiro, que vai sonhando com pequenos lugares.

Boa tarde. :)

(Imagem retirada da net, não sei quem é o autor.)


sexta-feira, maio 10, 2019

Se não escrevo...

Albert Camus, em 1954, disse que Meursault sofria daquilo a que ele chamava a loucura da sinceridade. Referiu ainda que era esse fascínio pela autenticidade do que sentimos e do que somos, que dava sentido ao seu livro: O Estrangeiro.

Quanto a mim, interrogo-me se também eu sou esse tipo de personagem: que nunca diz mais do que aquilo que sente. O problema é que aquilo que eu sinto é repetitivo, conhecido e, naturalmente, aborrecido. Assim, para quem me perguntou, aqui fica a minha resposta: se nada digo é, apenas, por nada ter para dizer. Isto é, nada novo ou interessante. ;)

Mas, caso alguém queira saber, admito que ainda sinto a necessidade absoluta de que falava Kundera: a necessidade de criar um continuum nas minhas experiências, na minha vivência, que a realidade, pura e simplesmente, não me dá, nem me poderia dar.

Também eu tenho consciência de que existo apenas num momento no tempo e que me movo a partir de um passado, em direção a um futuro desconhecido. Desse passado trago uma curta seleção de memórias isoladas, possivelmente modificadas, certamente interpretadas. Contudo, o grande problema não é sequer a autenticidade dessas memórias, mas sim a sua fragmentação, o facto de não serem contínuas.

Se as nossas memórias são fragmentadas, não será também assim a nossa existência?

Kundera dizia que a literatura, a ficção, poderia funcionar como compensação para estas falhas, permitindo recriar, através da imaginação, esse continuum existencial, que a realidade nos nega.

Talvez, agora na minha modesta opinião, a autenticidade do que somos e do que sentimos, também só se encontre verdadeiramente na literatura. :P

Para terminar, deixo (de novo) a imagem de alguém bem menos louco do que eu, numa pintura de Gottlieb Theodor von Kempf Hartenkampf. ;)


sexta-feira, março 29, 2019

Ver como se fosse a primeira vez...

A nossa visão é limitada, da mesma forma que é limitado o modo como vemos o mundo.

Na minha humilde opinião, o que nos afasta de toda essa limitação é a vontade e a determinação em ver as coisas, continuamente, como se fosse a primeira vez que as vemos.


Para lá das nuvens...

Por mais que os dias sejam solarengos, há momentos em que alguns de nós ainda se deparam com as nuvens que lhe escurecem a visão. Contudo, mesmo dentro de cada um de nós, há um ponto para lá do qual não há nuvens. O ponto onde eu me encontro, ou o ponto onde tu te encontras, são pontos sempre dinâmicos, nunca estáticos. O que vemos depende da nossa posição, da nossa perspectiva, que podemos sempre mudar.


sexta-feira, março 08, 2019

O sabor da cereja

O Sabor da Cereja, de Kiarostami, 1997.

Foi um filme que me marcou bastante, há muitos anos (e do qual estou a falar de memória), pela temática da depressão profunda. Apresenta-nos um homem completamente desligado. Um homem que deixou de sentir a natureza, a passagem das estações, a própria vida... O filme começa, então, por nos mostrar esse homem num carro, às voltas numa estrada de terra batida, numa paisagem árida.

O que vemos é sempre através da nossa visão muito particular, é tudo uma questão de perspectiva e, nesse contexto, eu vejo um homem às voltas num deserto. Que procura? Na verdade, procura muitas coisas...

SPOILER ALERT!

Há dois momentos no filme que quero relembrar: o instante em que nos contam a história do suicida que se afasta de casa de madrugada, pára junto a uma árvore e sobe para prender a corda com que irá enforcar-se. Ao prender a corda, sente nas mãos algo macio, com um cheiro intenso, apercebe-se que é fruta e leva-a à boca: cerejas (ou amoras). O homem deixa-se estar um bocadinho, a saborear as cerejas. Entretanto, o sol começa a nascer. E é esse o momento de revelação, o momento em que os sentidos que pareciam estar entorpecidos, voltam em pleno. Com o presente, com o agora, ele acorda.

Não foi o mundo que se modificou, foi a visão dele do mundo... Esse conto mostra-nos que é sempre a vida que se revela. Aquilo que nos salva e que nos devolve a nós próprios é algo que sempre esteve lá, algo que nunca perdemos verdadeiramente: a própria vida, feita de pequeninos instantes.

O segundo momento do filme que quero relembrar é o fim. O filme tem um final verdadeiramente assombroso e, na minha opinião, perfeito. O filme acaba precisamente mostrando-nos imagens da equipa de realização, do actor a confraternizar... E não será um pouco assim também na vida? Não estaremos de certa forma a representar também um papel, do qual muitas vezes já não sabemos sair é certo, mas ainda assim só um papel.

Há uma interpretação de mecânica quântica, da qual eu gosto particularmente: a teoria de muitos mundos, de Hugh Everett. De certa forma, seria um pouco como se a realidade fosse uma sobreposição quântica de infinitos universos paralelos não comunicantes. Nesta formulação da realidade, cada vez que seguimos numa determinada direção, é criado um universo paralelo onde seguimos na direção oposta. Nesse contexto, ser um santo ou um pecador teria a mesma importância, isto é, nenhuma. Bem, eu não acredito verdadeiramente nisto, mas gosto de me lembrar, de vez em quando, que os papeis que desempenhamos, bons ou maus, podem não passar disso mesmo: de papéis.

Talvez só estejamos verdadeiramente vivos quando estamos realmente no presente, sem passados e sem futuros. Sem máscaras e sem personagens, a sós com algo que só encontramos num curto instante: agora.

Bem, mesmo sendo um filme sobre um suicida, todo feito à volta da vontade dele de se matar, há neste filme algo mais, uma espécie de beliscão, que nos acorda para a vida.


quinta-feira, fevereiro 28, 2019

Filmes de John Ford

A propósito de cinema e de John Ford (um curto comentário, que escrevi noutro lado).

Ford, um dos primeiros realizadores que me fizeram apaixonar pelo cinema. :)

Bem, talvez algumas pessoas precisem de mais razões para ver Ford. A essas pessoas, eu gostaria de dizer que os filmes dele são de uma beleza estonteante, profundamente visuais, como se Ford fosse, antes de mais, um pintor, um grande pintor.

Não sei se quero escolher um favorito, mas a The Sun Shines Bright, How Green Was My Valley e The Man Who Shot Liberty Valance, acrescentaria ainda Rio Grande, The Grapes of Wrath, My Darling Clementine e How the West Was Won. Sendo que estes dois últimos foram filmados no mítico Monument Valley, algo que nos reporta de imediato ao horizonte Fordiano. Contudo, seguindo a ambiguidade característica de Ford, também o próprio conceito de horizonte Fordiano, para lá do imaginário associado ao Monument Valley, refere ainda um horizonte bem abaixo ou bem acima no enquadramento, retirando-nos da monotonia do horizonte sempre no meio.

A aparente simplicidade cénica, o diálogo reduzido quase ao essencial e as intensas cenas silenciosas, tudo se conjuga para aquilo em que Ford é verdadeiramente mestre: a autenticidade.

Para terminar, poderíamos dizer que Ford nos dá cenários, diálogos, filmes que, numa primeira vista, quase parecem simples ou até rústicos, mas que são profundos e complexos, a diversos níveis.

Sem dúvida, uma obra a (re)visitar. :)


Sábado filhoeiro

O sábado de carnaval é, segundo a tradição, o dia das filhoses. Bem, eu não estou a pensar fazer só filhoses, também haverá arroz-doce e uns quantos petiscos, bem caseirinhos e tradicionais. E nada melhor do que um piquenique no sábado filhoeiro, certo? A menos que chova e parece que sim, que haverá chuva. Assim, talvez não seja má ideia comer as filhoses e os petisquinhos em casa e, pelo meio, ver uns filmes. ;)

Pensei em Les beaux jours d'Aranjuez, sobretudo por ser do Wim Wenders, mas admito que a pontuação me deixou um pouco assustada. E não quero estragar o meu sábado filhoeiro. :(

Bem, era giro rever o meu filme favorito do Greenaway: The Cook, the Thief, His Wife & Her Lover, mas não creio que a sugestão seja aceite. Hmm, Como Água para Chocolate também seria uma opção mais ou menos adequada, não se desse o caso de eu querer algo um pouco mais dark. Qualquer coisa que me diga (como a canção que estou a ouvir agora mesmo):

come with me now
I'm gonna take you down

Hmm, para além disso, seria fantástico se tivesse uma relação qualquer com tradição e petiscos, filhoses se possível. ;)

Então, que filmes sugerem para o sábado filhoeiro? De preferência também um pouco herméticos, como a quadra transcrita por Ernesto Veiga de Oliveira:

Para jogar o Entrudo
Ambos teremos ventura
Tu dando-me as filhoses
Eu dando-te a fadura.

Ahahahaha… como é que é possível não gostar de manjares cerimoniais (a expressão é também do Veiga de Oliveira)?

Manjares cerimoniais e cinema, não? ;)

Braga, 28 de fevereiro de 2019.

p.s. Acabei de me lembrar de Babette's Feast, de Gabriel Axel. Um banquete ostensivo e decadente, num mundo austero e sombrio, que parece fazer parte do universo de Bergman… :)

Lembrei-me também de My Dinner with Andre, de Louis Malle, que é um filme que eu adoro. Contudo, ainda que o filme seja uma longa conversa entre dois amigos, na mesa de um restaurante, durante um jantar, a comida não parece ter nenhuma importância. ;)

sexta-feira, fevereiro 01, 2019

O que nos faz felizes...

Hoje, após o pôr-do-sol, começaremos a celebrar a nossa Festa da Promessa de Primavera, uma festa da luz, em que acendemos imensas velas, para dar força à luz do sol e aos dias que começam a crescer; para dar força aos nossos sonhos. Será uma noite para trazer de volta o nosso eu criança e alimentá-lo com música, poesia, brincadeiras e sobremesas à base de leite. :)

Certamente, terminaremos a noite com um filme em família, só ainda não sei qual será. Possivelmente, iremos rever A Canção do Mar, de Tomm Moore, 2014, ou talvez Kubo e as Duas Cordas, de Travis Knight, 2016. Eu simplesmente não sei dizer o quanto gostei destes filmes. São ambos incrivelmente belos, com mensagens profundas e maravilhosas. São filmes que nos transformam, que fazem de nós pessoas melhores e mais felizes. Muito mais felizes!!! :)

Desejo-te, então, uma bela e mágica noite de início de Fevereiro! :)

Hmm, deixa-me só dizer-te outra coisa: tudo o que precisamos para reencontrar a beleza e a magia, nesta ou noutra noite, é um olhar inocente. Hmm, eu sinto-me mais ou menos perto desse tipo de visão. Desde o final de outubro que faço um esforço consciente, para me libertar do excesso de bagagem e das minhas máscaras. Agora o ciclo é outro e é tempo de sonhar, de acreditar e de criar. E eu gosto mesmo muito de seguir os ciclos e a roda do ano! :)

(Foto by The Guardian of the Woods)


segunda-feira, janeiro 28, 2019

Um pequeno post a começar mais uma semana...

Bom dia. :)

Hoje, quero começar a minha semana com esta imagem de algumas pessoas a limparem os vidros num hospital para crianças, em Bristol. Quero começar a semana com a ideia de que os momentos extraordinários afinal podem ser bem mais comuns do que imaginávamos. ;)

Contudo, da mesma maneira que para um sonho se realizar ainda é preciso sonhá-lo primeiro, também aqueles instantes em que surpreendemos os outros e criamos memórias fantásticas, precisam primeiro de vontade e de dedicação. :)

Bem, um destes dias, num programa qualquer, Snowden dizia que ao longo do tempo, através de métodos que podemos nem sequer entender completamente, o que pode ser considerado sério foi estreitando sucessivamente. Ele falava em termos políticos, no sentido em que o que agora pode ser discutido e considerado uma afirmação sã, foi moldado de modo a alinhar-se com a opinião das maiores instituições da nossa sociedade ou até com a vontade das grandes corporações. Infelizmente, essa é a realidade, na nossa suposta democracia e mesmo na nossa vida quotidiana.

O mundo à nossa volta está constantemente a moldar-nos, a conduzir o nosso pensamento e a estreitar a nossa visão. Combatemos isso com a rebeldia de uma atenção consciente em relação a quem somos e ao que queremos. É uma luta onde tudo conta, onde os pequenos gestos definem o todo. Assim, é irrelevante que os outros nos considerem ridículos, o que realmente importa é continuarmos focados e mantermos a nossa própria visão do mundo. ;)

(Window cleaners at a children’s hospital in Bristol, by The Academy of Art, Creativity & Consciousness)


quinta-feira, dezembro 06, 2018

Fieis à nossa natureza

Ontem, quando fui buscar o meu filho à escola, ele disse-me que uma colega dele precisava de ajuda. Acrescentou que ela ia sozinha para a escola e tinha medo, andava um homem a segui-la. Disse-me que ele sabia disso porque ela tinha-se queixado à professora, na sala.

- O que é que queres fazer?
- Vamos buscá-la e levá-la a casa.
- OK. Não só podemos como devemos fazer isso, mas também é importante que percebas que ela, ou a família dela, nunca fariam isso por ti, se tu precisasses. Então, ainda queres ir buscá-la e levá-la todos os dias a casa?
- Sim.
- OK. 

Falamos com a miúda, perguntamos se queria que a fossemos buscar e levar a casa. Ela disse logo que sim. Combinamos, mas esta manhã ficamos imenso tempo à espera e ela não apareceu. 

Na escola, disseram-me que ela já tinha chegado. Quando referi a situação, insistiram que era tudo da cabeça dela. Noutro tempo, eu quereria saber como tinham chegado a essa conclusão. Agora, limito-me a supor que tenham alertado a Escola Segura e que tenha sido feita uma investigação.

Contudo, havendo ou não razões para alarme, a verdade é que a menina tem medo. E uma criança que vai sozinha e com medo para a escola é, no mínimo, uma situação bem triste. Mas, aparentemente, nem os pais nem a Escola querem ou aceitam ajuda. :(

Enfim, da próxima vez que o meu filho quiser ajudar alguém, tenho que acrescentar ainda outra pergunta:

- Sabes que, por melhores que sejam as nossas intenções, isto pode resultar mal e prejudicar-nos, de alguma maneira. Então, ainda queres ajudar?

Bem, parece que eu faço isso à espera que ele diga que não, mas não é verdade. Faço-o porque deposito tanta esperança no meu filho, que nem sequer duvido que ele vai continuar a dizer que sim!!! 

Termino este post com mais uma música da banda que eu ouço muitas vezes: Disturbed. Hoje, escolho a música The Light. :)

Hmm, já agora, deixo também uma imagem. ;)



quarta-feira, novembro 21, 2018

Receita de marmelada tradicional

Como sempre, nesta altura do ano, vou oferecendo umas taças de marmelada aos amigos. E, também como sempre, vou constatando que já praticamente ninguém faz a marmelada como se fazia antigamente. Agora, coloca-se o marmelo cru, em pedaços, juntamente com o açúcar e deixa-se cozinhar durante muito tempo, mesmo muito tempo. Depois passa-se a varinha e está pronto. Pouco importa que esse processo destrua todas as vitaminas da fruta e que deixe o produto final doce, mas insípido. É um processo moderno, logo é o melhor, não? Não, não é. Alguém pegou numa receita tradicional perfeita e transformou-a em algo que apenas retira qualidade ao produto final, tudo isso para reduzir um pouco o trabalho.

Enfim, deixemo-nos disto e vamos lá à receita tradicional de marmelada. ;)

Em primeiro lugar, cozem-se os marmelos. Podem cozer-se com a casca e até se poderiam cozer inteiros, mas esse processo é lento e perdem-se nutrientes. Assim, eu cozo-os em pedaços grandes, mas sem casca e sem caroço, uma vez que mais tarde utilizarei estes produtos para fazer geleia. Também os cozo ao vapor, por ser um processo de cozedura ainda mais rápido e que preserva as vitaminas e todo o sabor da fruta. Depois passo no passe vite e reservo.

Entretanto, coloco o açúcar ao lume, com um nadinha de água. Utilizo um quilo de açúcar para um quilo de marmelo cozido. O açúcar tem que apurar até estar quase a começar a caramelizar, mas não se pode deixar caramelizar. Tira-se, então, do lume e junta-se de imediato o puré de marmelo cozido, que não volta a cozinhar. Mexe-se com força, durante bastante tempo, até obter uma massa homogénea. Concordo que este ponto, no final, dá bastante trabalho, a menos que, neste momento, se use uma varinha mágica, que deixa tudo ligado e pronto, quase instantaneamente. ;)

Bem, se nem sequer dá assim tanto trabalho, se nutricionalmente é muitíssimo melhor, se o sabor é incomparável, então porque é que já praticamente ninguém faz a marmelada pelo processo tradicional? Para além da nova receita simplesmente ter virado moda, creio que há também o mito que a marmelada à antiga não fica dura, não se conservando durante muito tempo. Na verdade, por vezes esta marmelada fica mole, o que só quer dizer que o açúcar não atingiu o ponto que deveria ter atingido. Se for bem feita, esta marmelada não só fica dura, praticamente de imediato, como se conserva durante anos, ainda melhor do que outra. Tendo ainda a vantagem de que não estamos apenas a guardar um produto doce, que pouco mais teria do que açúcar, mas sim a preservar um produto delicioso, que contém muitos dos nutrientes da fruta. :)

Uma nota breve acerca dos marmeleiros: sobretudo nas variedades mais rústicas, são árvores que crescem em terrenos fracos, onde outras árvores de fruto não se desenvolveriam. Também são resistentes às pragas e à seca. Para além disso, ainda se propagam facilmente através de estaca, não necessitando qualquer enxertia.

Bem, para terminar gostaria ainda de referir que as supostas maçãs de ouro, do Jardim das Hespérides, representado nos altos-revelos do Templo de Zeus, em Olímpia, pareciam-se mais com marmelos, do que com maçãs. ;)


quarta-feira, outubro 31, 2018

Halloween 13/13

Para terminar, escolhi o tema This Is Halloween, do filme The Nightmare Before Christmas, de 1993, na versão de Marilyn Manson.

Feliz Halloween! :)

Já agora, para aqueles que estranham que eu insista em Halloween e não Samhain, bem, na verdade, ambas as palavras são meros rótulos, definem o que nós quisermos que definam. ;)


terça-feira, outubro 30, 2018

Halloween 12/13

Na penúltima música da minha lista de Halloween, mudo de registo e escolho The Beautiful People, de Marilyn Manson. ;)

Bem, o ideal grego da perfeição aliava a beleza física aos valores morais. A definição desse ideal per se é perfeitamente legítima. Por outro lado, a herança que daí advém, para a civilização ocidental, já é questionável, uma vez que estabelece uma relação entre a fealdade física e a fealdade moral. Os gregos estavam conscientes dessa falácia e combatiam-na. A título de exemplo, ocorre-me o elogio da fealdade, de Alcibíades, que era dirigido a Sócrates, que ele considerava feio em termos físicos, mas belo em termos morais.

Quanto à nossa civilização, creio que já estamos para lá disso, de estabelecer a relação entre a fealdade física e a fealdade moral. Mas, se é verdade que sabemos que essa relação simplesmente não existe, também é verdade que, cada vez mais, o que conta é apenas o aspecto físico, quaisquer que sejam os valores morais que lhe estão associados. Assustador, não? ;)


segunda-feira, outubro 29, 2018

Halloween 11/13

A lista está quase a acabar, assim, esta noite escolho uma canção verdadeiramente mágica e intensa. :)

Caller Of Spirits, de Blood Of The Black Owl, também é uma música estranha e assustadora. Hmm, que mais se pode pedir? ;)


 

Árvore de Halloween

Bom dia. :)

Está um friozinho bom, não está? O chão está coberto de folhas e sente-se mesmo o outono. O que é maravilhoso, até pelos meus manjares cerimoniais de Samhain, que sabem bem melhor no tempo frio. ;)

Que mais? Tenho a casa completamente decorada, com coisas de Halloween, naturalmente. Que posso eu dizer? Essa decoração, mais do que dar um verdadeiro ar de festa, tem aquela leveza e alegria que me encantam. :)

Assim, deixo aqui duas fotos das minhas Árvores de Halloween. ;)

Já agora, termino com o início maravilhoso de um livro de Ray Bradbury, cujo título é precisamente The Halloween Tree.

«The wind outside nested in each tree, prowled the sidewalks in invisible treads like unseen cats. Tom Skelton shivered. Anyone could see that the wind was a special wind this night, and the darkness took on a special feel because it was All Hallows' Eve. Everything seemed cut from soft black velvet or gold or orange velvet. Smoke panted up out of a thousand chimneys like the plumes of funeral parades. (...)»

The Halloween Tree, Ray Bradbury



domingo, outubro 28, 2018

Halloween 10/13

Esta noite, com tristeza, sobretudo pelo que se passa no Yemen, deixo uma frase que certamente nos faz pensar.

Quanto à música, escolhi mais uma canção de Monica Richards, I Am Warrior. Porque a luta continua!...