segunda-feira, dezembro 13, 2021

A sedução fácil de Monet...

Hoje, o facebook trouxe de volta um velho post, onde me indicavam um pintor e eu teria que escrever sobre a sua obra. Bem, só o copiei para aqui, porque estou com saudades do meu amigo Endo e quero dizer isso ao mundo. Acarinho a saudade e sinto que tudo o resto já não importa.

«Calhou-me, então, a sedução fácil de Monet. ;)

Bem, a primeira imagem que me ocorre é a das mulheres com chapéus de sol... não se chamavam sombrinhas? A recorrência desse elemento é um bocadinho irritante, digo eu. Mulheres com longos vestidos brancos, em meticulosos jardins. Jardins de flores predominantemente brancas… Ah! E todas aquelas telas que Monet dedicou às ninféias. É engraçado como eu me lembro disso, várias vezes, ao ver os nenúfares em Tibães. Os nenúfares que aparecem num espaço sempre limitado, mas que Monet nos força a imaginar sem princípio nem fim. Admito que gosto desses quadros dele. :)

Hmm, lembro-me de piqueniques… creio que se chamavam almoços, não? Não importa. Lembro-me de um piquenique num jardim, outro num bosque. Gosto particularmente desse no bosque. Tento lembrar-me das árvores. Tílias talvez. Não sei. Mas sei bem que as mulheres estavam vestidas de branco, ou de cores bem claras, e que a toalha estendida no chão era imaculadamente branca. ;)

Ocorrem-me ainda as paisagens fluviais de Monet, que era apaixonado pelo Sena. Eu identifico-me completamente com essa paixão por um rio. Mutatis mutandis, é como diz a canção: 

I consider myself lucky to have fallen in love 

With a girl, the city, and the river of mud

Sim, bem sei. É melhor parar por aqui, antes que a minha mente me leve para Dalila Pereira da Costa, uma escritora que me deu parte da minha visão do mundo. Mas isso foge completamente ao tema, a não ser por um pequenino pormenor: se eu imaginar uma mulher com um longo vestido branco e um delicado chapéu de sol, essa mulher será sempre a minha querida Dalila. :)

Para terminar, escolho, então, a pintura Amapolas en Argenteuil, óleo sobre tela, Claude Monet, 1873. Pela eterna suavidade da luz, pelo céu, pelas manchas vermelhas dominantes, aquelas belas flores silvestres, papoilas, bem mais ao meu gosto. Ah! E por retratar um passeio de uma mulher com uma criança, que me faz lembrar os meus passeios com o meu filho, sem dúvida, dos melhores momentos da minha vida. :) »



domingo, dezembro 12, 2021

Sem forma, vaga e incerta...

Antes de ir dormir, deixo um velho poema da maravilhosa Sophia de Mello Breyner Andresen.


Às vezes julgo ver nos meus olhos

A promessa de outros seres

Que eu podia ter sido,

Se a vida tivesse sido outra.


Mas dessa fabulosa descoberta

Só me vem o terror e a mágoa

De me sentir sem forma, vaga e incerta

Como a água.


Para mim não vem nem terror nem mágoa, por me sentir sem forma, vaga e incerta como a água. O terror vem quando me construo ou deixo construir, afastando-me de quem eu sou de verdade. E quem eu verdadeiramente sou é algo que tanto encontro agora, como quando tinha cinco anos e ainda estava completamente despida dos papéis que a vida me iria atribuir.

Na minha modesta opinião, este tempo, que precede Yule, é o tempo certo para nos prepararmos, libertando-nos de velhas máscaras e de velhos rótulos, para encararmos o Sol nascente com a nossa face nua.





quarta-feira, dezembro 01, 2021

Como nos livramos da armadura que já não queremos?

Hoje, ao fim da tarde, quando o meu filho preparava a mochila para a escola e colocava lá, como habitualmente, um livro, perguntei-lhe o que é que ele andava a ler. Respondeu-me que era O Cavaleiro da Armadura Enferrujada. Bem, eu adoro esse livro, que foi escrito em 1987, por Robert Fisher. Na verdade, foi um livro muito importante para mim. Mas fiz de conta que não conhecia e perguntei-lhe:

- Então, é sobre o quê?

- É sobre um cavaleiro que precisou de uma armadura, mas depois não a tirou, a armadura enferrujou e ele deixou de ser capaz de a tirar. E, agora, anda à procura de maneiras de se livrar de uma armadura que já não precisa.

- Hmm... e isso é o quê?

Ele sorriu e respondeu:

- Uma metáfora. 

E, sobre isto, eu nada mais tenho a acrescentar. ;)

Hmm, enquanto me deixo ficar aqui, só por um bocadinho, sentindo o peso que eu ainda carrego e que já não preciso de carregar, uma voz doce, como poucas, vai cantando: 

Sunrise, sunrise

Looks like mornin' in your eyes

:)

Boa noite.









quarta-feira, novembro 24, 2021

Swing

Dentro de cada um de nós existe um swing próprio, autêntico. Algo com que nascemos, que é só nosso, que não se pode ensinar ou aprender. Algo que não podemos esquecer. Mas ao longo do tempo, o mundo pode privar-nos desse swing. Fica enterrado dentro de nós, sob o peso das desculpas que arranjamos para o que devíamos ter feito. Algumas pessoas até se esquecem de como era o seu swing...»

Somos condicionados, desde crianças, a pensar que há um caminho para a felicidade, de tal modo que nos habituamos a ver a felicidade como algo que irá acontecer no futuro, quando várias premissas se concretizarem. 

Na verdade, não há nenhum caminho que nos conduza à felicidade, porque a felicidade é que é o caminho.

Contudo, para entrar nesse caminho, precisamos do nosso swing... e, por mais que eu esteja a ser repetitiva, irei continuar a dizer isto. Faço-o, em parte, para me ensinar a mim própria. Também eu preciso de reencontrar o meu swing e dançar nas clareiras ao luar.

:)

Termino com esta pintura mágica: Le villi, 1906, de Bartolomeo Giuliano.



quinta-feira, novembro 18, 2021

Coisas que não há que há

Hoje, no dia do aniversário do saudoso Manuel António Pina, deixo aqui um poema do qual eu gosto muito: Coisas que não há que há.


Uma coisa que me põe triste

é que não exista o que não existe.

(Se é que não existe, e isto é que existe!)

Há tantas coisas bonitas que não há:

coisas que não há, gente que não há.

bichos que já houve e já não há,

livros por ler, coisas por ver,

feitos desfeitos, outros feitos por fazer,

pessoas tão boas ainda por nascer

e outras que morreram há tanto tempo!

Tantas lembranças de que não me lembro,

sítios que não sei, invenções que não invento,

gente de vidro e de vento, países por achar,

paisagens, plantas, jardins de ar,

tudo o que eu nem posso imaginar

porque se o imaginasse já existia

embora num lugar onde só eu ia…


Pintura de Amadeo de Souza Cardoso, 1917.