sexta-feira, outubro 03, 2008

Carta para um amigo ausente

Olá, meu querido. :)

Há já muito tempo que não te escrevo, não há? Querido, tu estás sempre no meu coração. E sabes bem que eu nem sequer acredito no tempo e na distância, de modo que está tudo certo. ;)

Sabes, o meu mundo continua estapafurdiamente feliz. Ah! Não me perguntas porquê... sabes bem que não é preciso razões para se ser feliz. Eu adoro tudo isto, estes instantes em que te apetece sorrir e sorris, sem necessidade de razões transcendentes. Cada vez mais sinto que a vida é simplesmente maravilhosa. E, obviamente, sou suficientemente infantil para o dizer e repetir as vezes que me apetecer... hehehehe.

Aqui neste blog, tenho um pequeno post sobre o Míto de Sísifo. Diz o seguinte: Camus disse que era preciso imaginar o Sísifo feliz – actualmente eu não consigo conceber um Sísifo que não seja feliz. Sim, mesmo carregando a rocha montanha acima, mesmo sabendo que a rocha chegará ao topo do monte e necessariamente rolará até lá baixo e tudo recomeçará de novo... não vejo a inutilidade de outrora. Pelo contrário, vejo instantes profundamente significativos. Vejo a pausa reconfortante, o olhar que se deslumbra com a beleza da montanha, os olhos que se fecham suavemente sob o sol intenso. Será preciso algo mais?...

De certa forma, creio que já não quero um destino, o caminho esbate-se um bocadinho e é a caminhada que passa a ser cada vez mais importante.

Ok, voltemos ao mundo real. :)
No meu mundo real, os meus amigos estão fartinhos da minha contínua felicidade, para eles é um bocadinho como a cena do Tarantino no programa do Conan, em que ele disse que foi ver um filme qualquer romântico, com uma história simples e feliz, sem grande dramas, e quase teve que ligar para a linha de apoio a suicidas. :)

Por isso escrevo-te a ti, meu querido, pois sei bem que tu não achas toda esta minha felicidade enjoativa. Quanto a mim, hum, que posso dizer? Nem imaginas a quantidade de pessoas que me telefonam quando estão mal e só quando estão mal. Começo a ver que perco o meu tempo, pois nada do que eu diga parece fazer qualquer diferença e, o que é ainda pior, por vezes perco também a minha boa disposição. Eu não consigo que a minha felicidade passe para eles e, muitas vezes, acabo esgotada e triste. Às vezes, parece-me que eles não querem ser felizes. Ou, então, já estão demasiado habituados à complexidade que criaram nas suas vidas. E a felicidade é uma coisa simples.

Meu querido, eu sei muito bem que uma das coisas que me deixa feliz é precisamente o amor que há na minha vida. Eu amo profundamente o Alexandre e sei que sou amada. Essa vontade de um amor verdadeiro e correspondido foi uma das mais profundas necessidades que eu tive ao longo da vida. E só quando o alcancei é que consegui acalmar e ser verdadeiramente eu própria. De modo que eu entendo a necessidade deles, entendo o desespero deles que, na maior parte das vezes, passa por relações amorosas infelizes. No entanto, quando eu lhes digo que esse tipo de realização só depende de cada um de nós, aborrecem-se. Sim, sei bem que se escutarmos a maioria das pessoas, hão-de desencantar milhões de razões que nos mostrarão como isso é ridículo, que, para começar, o amor verdadeiro nem sequer existe ou, se existe, é por mero acaso. Não é, digo-te eu. E, acredita, eu sei do que falo. Saberão também eles?...

Um amor intenso e verdadeiro, um amor correspondido, um amor que dê cor e alegria à nossa vida, é na verdade um milagre, mas um milagre que depende de nós. Temos que o plantar bem fundo no nosso inconsciente, temos que o fazer germinar e alimentá-lo para que continue sempre a florescer. Sim, temos que tratar dele sempre, porque ainda que nasça e floresça, se nos esquecermos de o alimentar, seca e morre. Mas depende sempre de nós, da nossa dedicação. No entanto, não é fácil. E é exactamente por isso que muitos não o vivem, porque ficam-se pelas conhecidas soluções de facilidade... de que se queixam, então?

Digo-lhes que têm que pensar no amor que há-de vir como se já existisse. Peço-lhes para não se sentirem ridículos e de modo algum falarem nisso... há que manter o segredo, isso ajuda a acreditar. Se dedicarem os primeiros e os últimos momentos do seu dia a esse amor que querem, se o imaginarem, se acreditarem nele, sem particularizarem em relação a uma ou outra pessoa, se sentirem que esse amor intenso de alguém que já está na sua vida, mas que ainda não conhecem pelo nome, é real... então, acontecerá de verdade, será real.

Há um filme engraçado, que eu gosto muito, Amor e Vacas, de Harry Sinclair. Bem, o filme é simplesmente delicioso. Conta a história de uma mulher que vive um amor feliz mas, deixa-se levar por medos irracionais e quase perde o homem da vida dela. A história começa quando ela por descuido atropela uma mulher idosa, que acaba por não sofrer nada. Ainda assim, percebe-se que ela se sente culpada. A mulher entretanto diz-lhe para ela se manter quente, aconchegada. E isso desencadeia o medo dela, o medo de que a relação de algum modo arrefeça... a partir dali, tudo se torna hilariante mas comovente, complemente estranho mas ainda assim real naquilo por que se luta. E mostra bem como nós temos sempre crenças... às vezes, estão é mal direccionadas. Às vezes acreditamos no que só nos faz mal. Tememos que a felicidade acabe e, naturalmente, a felicidade acaba. Outras vezes, temos medo que a felicidade nunca apareça... e não aparece. Para quê ter medo?...

Por falar em filmes, domingo vamos ver Nightwatching, do Greenaway. Bem, já nem me lembro há quanto tempo não vejo um filme do Peter Greenaway no cinema. :))

Bem, tenho que ir, vou almoçar.

Até amanhã, doçura. :)

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