quinta-feira, janeiro 28, 2010

A história da princesinha triste

Era uma vez uma jovem e bela princesa, como todas as princesas são e como só elas sabem ser. E a jovem e bela princesa vivia num reino longínquo, para lá do sol nascente. Era um reino calmo e pacífico, onde o sol da manhã despertava risos e cantares. E a noite era serena, cheia de estrelas para os meninos contarem. Era um reino bonito.

Os habitantes desse reino, que mal se vislumbrava no horizonte distante, eram seres muito especiais: tinham sonhos, sonhos que sonhavam acordados. Porque sabiam que para um sonho se realizar é preciso sonhá-lo primeiro. E acreditar nele. Mas a princesa, que era a senhora daquele reino por direito próprio, esqueceu-se de sonhar. E muitos dias se passaram sem que ela tivesse consciência da perda, embalada pela calma e tranquilidade das pessoas que a rodeavam.

Todas as manhãs o sol entrava, igualmente radioso, no quarto da jovem que despertava. Mas, um dia, a tristeza também se fez convidada. E, rapidamente, passou de visitadora ocasional a uma presença constante. A princesa estava triste. Manhãs que davam em tardes, tardes que davam em noites, noites que, novamente, davam em manhãs - e a princesa continuava triste. Até que um dia deixou de querer, ou saber, estar diferente.

Preocupado com o estado da princesa, o rei mandou chamar todos os médicos da corte, para a examinarem. E todos a tentaram curar, mas nenhum achou cura para tal mal. Irado com a sorte que cabia à sua querida e amada filha, o rei disse aos médicos que eles tinham que apresentar um remédio capaz de curar a princesa, no período máximo de vinte e quatro horas. Tremendo perante a cólera do rei, os senhores doutores reuniram-se, para juntos descobrirem o remédio para o mal que afligia a jovem princesa. Quando o tempo determinado estava quase a acabar, pediram uma adiência. Um deles deu um passo em frente, tomou a palavra e disse:

- Meu senhor e meu rei, soberano amado por todos os vossos servos: que tenhais uma longa vida, juntamente com a vossa querida e muito amada filha. Chamaste-nos aqui para descobrirmos uma cura para o mal que atormenta a princesa. E um só remédio encontramos: para a princesa se curar é necessário que vista, por momentos, a camisa de um homem que seja feliz em todos os instantes da sua vida.

E fazendo uma profunda vénia ao rei, afastou-se. Imediatamente foram enviados emissários por todo o reino, à procura do homem que fosse feliz em todos os instantes da sua vida.

Longos caminhos percorrem os viajantes, na busca do homem feliz, sempre feliz, em todos os instantes da sua vida. A lua faz-se nova, outra vez. Ei-los, de novo, passando das pradarias verdejantes aos àridos desertos. Heróis na procura e no querer, vontades fustigadas por muitas adversidades, mas vontades que continuam sempre fortes. Desistir não, nunca. E os caminhos começam a repetir-se. Quem saberá ensinar aos viajantes cansados o porto onde chegar? Arco-íris sempre distante. Os pés arrastam-se no solo poeirento, o mesmo solo ou outro. Já nada acompanha o lento arrastar de passos, a não ser o eco de risos repetidos na resposta que é também pergunta:

- Feliz eu? em todos os instantes da minha vida? Ah! Ah! Ah!...

E os mensageiros avançam sempre, sempre. Incapazes de desertar ou desaprender, continuam a acreditar em impossíveis.


Era uma floresta frondosa onde predominavam os velhos carvalhos. Muitas aves nidificavam nas ramagens da enorme floresta. E os seus chilreios povoavam o silêncio. Coelhos saltitavam à procura de comida, protegidos por giestas e outros pequenos arbustos. Ao longe ouvia-se o lamento de um lobo só. A noite aproximava-se suavemente. Pouca era a claridade que iluminava aquele velho bosque. Só um ou outro raio de sol terminava a sua viagem no solo, infiltrando-se num espaço esquecido pelo arboredo denso. E os viajantes de outras paragens continuavam ali a sua procura impossível. Embora, naquele momento, apenas se importassem com o manto negro da noite, que descia sobre eles. Esquecidos, há muito tempo, do conforto de outros lugares, os homens preparavam-se para esperar, no meio das trevas, a vinda da manhã. Mas, de repente, no meio da escuridão que os envolvia, descobriram o brilho de uma pequenina luz. Tropeçando e às apalpadelas, foram-se aproximando daquela dádiva divina.

Espreitavam pelas frestas de uma cabana, feita com troncos grossos. No outro lado da cabana, no meio de três pedras de granito, que formavam uma lareira improvisada, ardia um fogo intenso e aconchegante. Junto ao fogo estava sentado um homem ainda novo, que vestia roupas grosseiras e quase gastas, remendadas com bocados de pele de coelho. Tinha perto de si um velho pote: uma panela de ferro, que assentava no chão sobre três pés. Mexia, com uma colher de pau enegrecida pelo uso, o caldo espesso e fumegante que cozinhava ao lume. Por fim, afastou o pote do lume e algum tempo depois começou a comer, no velho pote e com a mesma colher de pau. Quando acabou de comer, deitou-se de costas no chão, perto da fogueira, tendo os braços cruzados debaixo da nuca e sorrindo. E o sorriso era genuíno, vindo de um interior cheio de luz. Um sorriso que lhe transformava o rosto numa máscara engraçada de rugas e covinhas. E os olhos dele também riam. Até que o sorriso se tornou numa gargalhada e o homem disse, por entre o riso:

- Sou feliz em todos os instantes da minha vida! - e um pouco mais baixo, acrescentou - Porque me habituei a isso.

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