Começo por sonhar que estou a acordar. Contudo, olho à volta no quarto e vejo de imediato que continuo a sonhar. Não recordo a razão que me levou a concluir isso. Mas o facto de saber que ainda estava a sonhar deixa-me deliciada. Decido sair, partir à aventura. Levanto-me e visto-me. Nesse momento reparo em dois gatos que estão comigo no quarto: uma gata tartaruga e um gato preto. Na realidade eu tenho duas gatas, uma tartaruga e uma preta. No entanto, no sonho eu não reconheci aqueles gatos como meus, eram apenas gatos. Os gatos não querem que eu saia. Eu rio e digo que vou mesmo sair. Visto umas calças de ganga e uma camisola preta. E calço umas sandálias cheias de cor, artesanais e muito bonitas - que eu não tenho :). Por último, pego no telemóvel e abro a porta do quarto.
Mal saio do quarto, a realidade transforma-se: à minha frente há um corredor enorme, com imensas portas. Muitas dessas portas também se abrem e outras pessoas aparecem no corredor. Pessoas que no sonho eu reconheço, que me cumprimentam e que eu cumprimento. No mundo real não conheço nenhuma daquelas pessoas. Quando acordei pensei que se calhar eram também sonhadores, mas isso já é a minha mente a fantasiar. Ou não. :)
Do corredor saímos para um pátio, descemos algumas escadas e deparamos com uma praça ampla, de uma cidade medieval, imponente, fantástica. Eles dirigem-se todos para o mesmo sítio e eu sigo-os. Paramos em frente a um imenso templo de pedra. O templo é magnífico. Eu fico completamente extasiada. Fico a olhar à volta, enquanto os outros entram no templo, que foi construído na encosta de um monte bastante íngreme. E, do sítio onde eu me encontro, o topo do monte parece uma continuação do templo. Ao ver o monte por cima do templo, sinto um reconhecimento imediato. O fascínio que o monte exerce sobre mim é absoluto. E, com alguma pena afasto-me do templo, em direcção ao monte. Pouco depois, começo a correr com desespero. Só páro quando sinto o impacto do lugar, a forte energia telúrica que me rodeia. Estou nitidamente numa fronteira: até ali percorri um terreno relvado, agora à minha frente começa a floresta, uma floresta incrivelmente densa. Eu hesito por segundos. E, de repente, apercebo-me que há imensa gente a caminhar para a floresta, parece uma procissão. Eu entro de imediato no cortejo e sigo com os outros. Quando entro na floresta, tenho percepção de um intenso murmúrio, a pouco e pouco vou dando conta de que as árvores, os arbustos, enfim, toda a vegetação daquela floresta "ronrona". Sim, é uma espécie de ronronar feliz. Fico maravilhada. E não recordo nada mais da passagem pela floresta sagrada, a não ser o momento em que saí da floresta, do outro lado do monte, ainda inundada de uma felicidade intensa.
À medida que vou descendo o monte, sinto o vento nos meus cabelos, ouço o riso das pessoas que me acompanham e eu própria tenho vontade de rir. Penso que não me lembro de me sentir assim tão viva, quando estou acordada. Ou feliz. :)
Descemos até um planalto vasto, onde há centenas de menires. Eu olho, mas não entendo, não consigo ver desenhos ou formas inteligíveis naquela floresta de pedras. Limito-me a seguir os outros... Lembro-me de sentir a forte intensidade do sol, enquanto serpenteava pelo meio da pedras. Até que por fim chegamos ao círculo central onde várias pessoas dançam, sem música, em transe. Eu e os outros começamos também a dançar. E, muito rapidamente, eu começo a sentir um calor incrível em todo o meu corpo. Danço durante imenso tempo, até que alguém me abana e me diz para seguir a procissão que abandona o círculo. Eu vou, cambaleante ao princípio, depois, já mais coordenada e consciente. Vejo que nos dirigimos para um lago, ainda mais em baixo, no vale.
Quando chegamos ao vale, eu reparo que o lago é articifial, uma espécie de piscina gigantesca, de pedra. As pessoas serpenteiam pelo lago, parecem caminhar sobre a água. Quando é a minha vez de entrar na água noto as pedras ligeiramente cobertas de água, por onde os outros caminham. Sigo o caminho das pedras. À minha volta a água é límpida, de uma clareza sobrenatural. Reparo que o lago tem uma profundidade incrível. Penso que se não estivesse a sonhar se calhar tinha medo de caminhar naquelas pedras que, na verdade, são colunas gigantescas. Penso por instantes no facto de saber que estou a sonhar e fico de imediato incrédula, constato como tudo à minha volta é tão incrivelmente real e as dúvidas intensificam-se.
A procissão segue em silêncio, num caminho serpentiforme. Por fim, chegamos a uma casa no meio do lago. Uma casa de pedra cujos alicerces são impossíveis de vislumbrar, de tão profundos. Entramos na casa de pedra por uma larga porta em arco. E, de repente, tudo escurece. Deparo com pequenas plataformas, cheias de pessoas, que, aparentemente, tem medo de avançar mais. Eu não sinto qualquer receio, só um fascínio enorme. Nada me poderia afastar dali. Continuo, habituando-me a pouco e pouco à menor luminosidade. As pedras por onde caminhamos são agora mais lisas e escorregadias. Mesmo assim, não tenho medo. Continuo a avançar, sempre pelo caminho das pedras.
Estou perto de um terraço enorme, onde nos aguardam algumas pessoas. Há apenas duas ou três pessoas entre mim e o fim do caminho. As pessoas, à minha frente, são recebidas de um modo efusivo. Eu reparo em especial num rapaz no fim da adolescência e numa mulher com uma idade indefinida, de quem todos parecem querer aproximar-se. Ela recebe a pessoa antes de mim e vai-se embora. Eu fico desolada. Avanço para o terraço, ajudada pelo rapaz que me dá a mão. Ele olha para mim e ri do meu ar infeliz. Sem largar a minha mão, leva-me, conduz-me ao logo de várias salas de pedra, paralelas, vazias, sem janelas, contudo com uma luminosidade própria, não muito intensa e sem partir de um ponto específico. Por fim, paramos. Ele larga a minha mão e outra jovem aproxima-se e coloca-me uma coroa de flores na cabeça. E, de imediato, fazem-me entrar noutra sala. Estão várias pessoas nessa sala, uma delas é a mulher que se afastou de mim à saída do lago. Ela sorri e pergunta-me se está tudo bem. Eu digo que a coroa de flores está apertada. Todos riem. A jovem que ma colocou, dirige-se para mim e alarga a coroa. A outra mulher volta a dirigir-se a mim, pergunta-me se já me sinto capaz de assumir a minha responsabilidade? Eu pergunto: «qual?» e acordo de imediato.
Acordo e quero voltar ao sonho. Fecho de novo os olhos e, por instantes, sinto que estou quase de volta. Mas o rapaz que me acompanhou pelas salas, fica à minha frente, diz uma palavra estranha que eu não entendo e eu acordo, de vez.
Obrigada. Muito obrigada pelo sonho. Sinto-me verdadeiramente agradecida. Não sei ainda como o interpretar. Não sei sequer se o quero interpretar. Mas, adorei o sonho. Obrigada.
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